Na linha das orientações europeias para a educação, particularmente as relativas à redução das taxas de Abandono Escolar Precoce (AEP) para 10%, Portugal tem implementado inúmeras mudanças na educação. Desde 2015, há um foco na inclusão educativa através de um conjunto de medidas políticas e de maior investimento na diversificação da oferta educativa. Dá-se continuidade a medidas como a extensão da escolaridade obrigatória (em 2009), que constituiu um marco no campo da educação, juntamente com outras medidas para consolidar a escola para todos.
Abandono precoce da educação e formação
Destaca-se o Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho, que estabelece o currículo dos ensinos básico e secundário, tendo em vista o desenvolvimento nas e nos jovens das capacidades e atitudes que contribuam para alcançar as competências previstas no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, tendo como princípios orientadores, para citar apenas alguns no âmbito do presente documento, a autonomia e flexibilidade curricular; a garantia de uma escola inclusiva; o reconhecimento das e dos professores enquanto agentes principais do desenvolvimento do currículo; a valorização do desenvolvimento de projetos interdisciplinares e do trabalho colaborativo; a valorização dos percursos e progressos realizados por cada estudante; a importância da mobilização de literacias diversas e de múltiplas competências, teóricas e práticas; bem como a promoção da educação para a cidadania e do desenvolvimento pessoal, interpessoal, e de intervenção social. Embora não informando o trabalho das entidades educativas envolvidas no Projeto, é também de dar relevo à Portaria nº 181/2019, de 11 de junho, que ampliando a autonomia e flexibilidade curricular estimula as escolas a implementar uma gestão superior a 25 % das matrizes curriculares-base das ofertas educativas e formativas dos ensinos básico e secundário, adotando um plano de inovação e a carga horária das matrizes curriculares-base que pretende gerir, em função do contexto de cada comunidade educativa e promovendo qualidade e sucesso nas aprendizagens. Com efeito, as medidas referidas têm-se traduzido em grandes progressos, como uma diminuição significativa das taxas de AEP – agora, Abandono Precoce da Educação e Formação -, de 50% em 1993, para 8,9% em 2020. Pesquisas anteriores, em especial no projeto RESL.eu, sobre os objetivos, drivers e rationales subjacentes às políticas educativas, acentuam que um número considerável de jovens continua a abandonar a educação e formação sem concluir a escolaridade obrigatória.
Jovens: a população em maior fragilidade face ao emprego
Um elevado número de jovens está em situação de desemprego ou precariedade laboral, com números superiores aos da média europeia. Sabe-se que baixos níveis de qualificação têm impacto nas taxas de desemprego, dado que não completar o ensino secundário aumenta 1,5 vezes as probabilidades de ficar desempregado. Apesar de algumas melhorias nos últimos anos, particularmente em 2019 – quando o desemprego entre os jovens entre os 15-24 anos em Portugal caiu abaixo dos 20% pela primeira vez em 10 anos, a crise pandémica teve um impacto nos níveis de desemprego juvenil, que aumentaram 4% entre 2019 e 2020. Assim, em 2020, o desemprego entre os menores de 25 anos em Portugal era 5,8%, superior à média da UE27. Entre os jovens que tiveram um emprego em 2020, 56% tinham contratos temporários, enquanto 20% tinham empregos a tempo parcial (Portugal tem a sétima maior taxa entre a UE27 de jovens empregados em empregos que são involuntariamente a tempo parcial), outro indicador da precariedade que este grupo tem de enfrentar. Além disso, as mulheres jovens são mais frequentemente afetadas do que os homens por contratos temporários e empregos a tempo parcial e a percentagem de jovens não empregados que não estão em educação ou em formação (NemNem) aumentou em 2020, após anos de progressos – evidenciando o impacto da pandemia. Em modalidades educativas informadas pela competitividade, acentuaram-se desigualdades no acesso e sucesso à educação, no que concerne a aspetos como o domínio de uma cultura digital e o acesso a recursos a ela associados.
Tensões na diferenciação da oferta educativaNo quadro de uma crescente diferenciação na oferta educativa que tenta dar resposta à diversidade das e dos estudantes que hoje frequentam as instituições, continua, no entanto, a evidenciar-se uma tendência de hierarquização entre sistemas, que dividem os grupos jovens na educação em ‘escolarizáveis’, com expectativa de prosseguimento de estudos universitários, e menos ‘escolarizáveis’ ou ‘profissionalizáveis’, inseridos nas outras ofertas. Dá-se destaque à prevalência da burocratização do trabalho docente, que conduz a menor investimento na dimensão relacional da pedagogia, a currículos demasiado extensos e complexos, e ao foco na educação contábil, ou seja, na avaliação final, num enquadramento da educação (instituições, profissionais e jovens) enquanto produto. Na abordagem EduTransfer parte-se da preocupação com a necessidade de maior participação jovem na construção de conhecimento a partir da experiência nos seus contextos de vida. Tendo a participação na cidadania vindo a ser enquadrada por atividades normativas sancionadas pelo Estado e pelo envolvimento no mercado de trabalho remunerado, as pessoas aprendentes, vistas como em preparação para a cidadania, por meio da educação, não têm, muitas vezes, sido reconhecidas como cidadãs, com plenos direitos, que participam no seu presente. As suas experiências, de escolarização e formação, em particular, são orientadas para a – e pela – vida adulta, ou seja, projetadas no futuro, enquanto pessoas adultas que deverão inserir-se, e dar resposta às necessidades da sociedade. Não valorizando razoavelmente os seus saberes nem as suas experiências, esta perspetiva situa em deficit as pessoas aprendentes, provocando um deficit na sua participação. O projeto em referência vem na contracorrente desta abordagem.